Kiô e eu ficamos nos perguntando se a arte drag já se emburguesou no Brasil? A arte drag vem da periferia. Se analisarmos o seu surgimento nos EUA, a gente vai ver que ela vem de uma cultura do gueto. Como isso tudo surgiu lá nos EUA, é claro que lá a história de construção da identidade e da cultura drag é muito mais longa que a nossa cá no Brasil.
Lá, a arte drag se popularizou e com isso, ela saiu do gueto, já que ser drag é algo que diz respeito ao gênero das pessoas. Se diz respeito ao gênero em intersecção com a arte, então todo mundo pode ser drag: rico ou pobre.
Mas o que eu quero dizer é que muitas vezes somos taxadas de closeiras. Isso quer dizer que a drag está muito interessada no close. E mais do que isso, essa ideia pode levar a pensar que a drag é vazia e fútil. O close, por si só, é mal visto. É preciso ir além do close. É preciso dar duro.
Eu, pessoalmente, não concordo que o close seja futilidade. Pois, rica ou pobre, principalmente as pobres, todas temos de saber lidar com os TRUQUES. É um truque aqui na maquiagem, é um truque ali na peruca, é um truque acolá num acabamento para o figurino e outro para toda a performance. Esses truques são necessários pois nem sempre há material disponível, nem sempre há condições financeiras. E é preciso transformar ou exagerar ou realçar o gênero sempre! A cultura drag surgiu no gueto, na pobreza.

Nossos truques são baseados numa tradição, que está disposta a se renovar sempre, sempre que um novo truque surgir (melhor e mais viável: e note que isso é relativo para cada pessoa). Nossos truques, nossas performances, nossa presença é close, mas é um close também baseado num trabalho duro. A diferença é que o trabalho da drag, baseado numa tradição periférica do truque, não é reconhecido como um trabalho, pois não está majoritariamente baseado na técnica burguesa.
O conjunto de técnicas historicamente burguesa é denominado “trabalho”, “dança”, “teatro”, “balé”, “ópera” etc...
O conjunto de técnicas historicamente drag é denominado “close”.
Voltando a pergunta inicial, podemos dizer que lá nos EUA a arte drag já está emburguesada faz bastante tempo. Surgiu na periferia, mas se popularizou. Já no Brasil, a arte drag nunca foi exclusivamente periférica. No Brasil, a arte drag já nasceu híbrida. Quem tinha condições de importar maquiagens e perucas? Hoje, ontem e sempre haverá drags ricas e pobres! A diferença é que as drags ricas podem optar por seguir o caminho tradicional dos truques ou dar o seu truque através do seu dinheiro (que pode comprar dos melhores materiais, dos melhores cursos, dos melhores marketings), enquanto que a produção da drag pobre, baseada no truque, conta com muita criatividade de transformação e espera a sorte grande de um dia ficar reconhecida.
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Por: Jaqueline Furacão
Fotos: Valerie Baeriswyl e Arquivo Pessoal